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quarta-feira, abril 11

PROCULTURA: UMA ODISSÉIA EM PELOTAS


PROCULTURA: UMA ODISSÉIA EM PELOTAS
 
 
Por Leandro Maia
Músico
 
 
I
PROCULTURA é o nome do Programa Municipal de Apoio à Cultura instiuído pela Lei Municipal Nº 5.662, de 30 de dezembro de 2009. O programa é gerido pela Secretaria Municipal de Cultura, a SECULT, atualmente dirigida pelo Sr. Secretário Ulisses Nornberg. Vale ressaltar, de início, que a referida lei constituiu-se num grande avanço para a cidade, pois implementa uma política pública democrática, transparente, plural e eficiente, se realizada de fato.

II
É um avanço exemplar em vários sentidos. A proposta surgiu como uma demanda da própria comunidade cultural pelotense, através da manifestação de artistas e ativistas da cultura, de seminários como “Primavera da Cultura Livre”, promovidos pelos diversos coletivos e movimentos culturais da cidade, que é uma referência em cultura no Rio Grande do Sul e Brasil. Um avanço porque nasce do diálogo entre comunidade cultural e poder público. Um avanço porque compreende a cadeia produtiva do setor e sua organização como Economia da Cultura. Avanço porque entende as artes e a cultura como campo de trabalho, emprego e renda, além de elemento fundamental para a estruturação da subjetividade e imaginário simbólico de uma população. Uma programação cultural forte na cidade contribui para a educação, para o turismo, o lazer em diversos âmbitos da vida das pessoas.

III
O diálogo parece rompido unilateralmente, como se o tampão de ouvido utilizado por Ulisses, herói da Odisséia, ao invés de protegê-lo do canto das sereias, o tivesse protegido do canto dos artistas da cidade. Isto porque o Secretário Ulisses e o Prefeito Adolfo Fetter, decidiram utilizar as verbas destinadas ao Programa Municipal de Apoio à Cultura – que é gerenciado através de edital público, implementado por técnicos e avaliado por especialistas – em outras prioridades, digamos, o que gerou um “erro de sistema”, ocasionando atraso nos pagamentos. Desde o ano de 2011, diversas explicações foram dadas. Mas explicação não é diálogo. Diálogo é cumprir o que foi acordado, decretado, selado, registrado, carimbado, avaliado, rotulado, se quiser voar. Plunct, Plact, Zum, não vai a lugar nenhum, como diria o velho Raul. Se a cidade apresenta problema em relação a espaços culturais (vide Theatro Sete de Abril), apresenta também sério problema na área de financiamento à cultura.

IV
Voltando aos gregos: um simples jogo de lógica nos faria pensar a respeito. 1) O gestor público institui o PROCULTURA democrático, transparente, plural e eficiente. 2) O gestor público não executa o PROCULTURA democrático, tranparente, plural e eficiente. 3) Qual é a conclusão? Podemos afirmar que o gestor público é democrático, transparente, plural e eficiente? Talvez o procedimento de silogismo não esteja a contento e o autor possa parecer um sofista, mas o exercício é revelador da atual situação da Cultura em Pelotas. O mesmo gestor que cria a lei, não a aplica. Como fica?

V
E mais: o Programa não está completo. Recentemente em audiência sobre o tema na Câmara de Vereadores, realizada em 23/03/2012, ficou esclarecido outro “erro de sistema”: a verba do Procultura não se constitui num Fundo Municipal, não apresenta reserva ou destinação alguma. Não tem valor fixo, não tem prazo, vinculação. Nada obriga a Prefeitura a executar o orçamento referente ao Procultura – a não ser, é claro, o compromisso firmado através de editais e o controle da sociedade civil. Temos, então, um “cavalo de Tróia”, uma “Economia Informal da Cultura”, embora existam contratos assinados desde janeiro prevendo o repasse de verbas e execução de projetos importantes para a cidade. Um verdadeiro épico do financiamento à cultura.

VI
Vale ressaltar à população e ao poder público atual e futuro – já que estamos próximos às eleições municipais – que é urgente que o programa transforme-se realmente num Fundo. Isto é uma diretriz do próprio Ministério da Cultura (MinC) para o setor. Somente poderá participar do Sistema Nacional de Cultura, em fase de implementação, a prefeitura que tenha o chamado “CPF”, ou seja, que tenha instituído um Conselho, um Plano e um Fundo Municipais de Cultura. Se o Sistema Nacional de Cultura já estivesse em vigor, Pelotas não poderia participar dele, pois o Programa de Apoio à Cultura (PROCULTURA) não é gerido por meio de um Fundo Municipal, que tenha receita e rubricas próprias. É gerido através de uma verba aleatória e perambulante junto aos cofres da Prefeitura Municipal entre um carnaval e outro. Não ter um Fundo Municipal de Cultura em Pelotas impossibilita que a cidade receba, inclusive, verbas federais para o setor. Resumindo: além de não pagar o que deve, a Prefeitura Municipal impossibilita que venham outras fontes de recursos para a Cultura de Pelotas, pois a cada real investido pela Prefeitura, prevê-se um real do Governo Federal. Como está atualmente, o Procultura vive ao sabor dos ventos da nave de Ulisses em meio ao Mar Egeu. Antes fosse o Laranjal. Que a situação se resolva sem maiores tragédias e o PROCULTURA cumpra seus mais de doze trabalhos a serem realizados ainda neste ano.
 
 

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